Primeira Entrada do Diário Laboratório de 14/3/2018
14/3/2018
(Primeira Entrada)
Ventos atrozes os da impaciência.
Os da obsessão fragmentária.
Quisera a obra extensa e, por isso,
também intensa pois, num certo sentido, amiúde puramente
quantitativo, a respiração dilatada permite a exploração das
intensidades intrapsíquicas, do detalhe descritivo, da modelação
lenta, por exemplo, de um personagem.
A brevidade, fulguração exígua, tem
evidentes limitações.
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Entrada do Diário Laboratório de 13/3/2018
13/3/2018
A ansiedade é sempre um sentimento
d’angústia - um aspecto existencial que é uma captura. Sentem-se,
obsessivamente, as seguintes perguntas: «porquê eu?»,«porquê eu,
nesta conjugação cósmica que fez levantar-se esta urgência?».
Porque também há algo de urgência - no fazer, quando se quer
restar quedo; no não fazer ainda, quando se exige a espera.
A ansiedade: suster (ou acelerar) a
temporalidade específica do contexto ansiogénico, de tal modo que
se suspendam as causas ou que se remetam, instantaneamente, para o
passado.
Não custa entender que esse
sentimento, na escrita, seja lídimo produtor do fragmento:
suspende-se o texto no momento em que surja a primeira dificuldade;
remetê-lo para o passado, começando logo outro escrito; por igual
curto, provisório e já arcaico.
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Entrada do Diário Laboratório de 12/3/2018
12/3/2018
(Consideração)
É algo de terrível a hora-do-lobo.
Tempo de calma e desolação.
É algo de terrível porque se
contempla já – isto é, em qualquer momento da vida - a
senelescência e a sua miséria, a fauce escancarada da ceifeira,
tudo o que se perdeu e, ademais, parece fazer-se presente tudo o que
se irá perder.
É também bela a hora-do-lobo pois é
a vivência do vício da melancolia.
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Entrada do Diário Laboratório de 11/3/2018
11/3/2018
A literatura não é quem sou mas estou
todo nela.
Um modo, quiçá, de me saber em
tod’esta errância. Um modo, quem o adivinha?, de entender o devir
do mundo e eu nele ou de o compreender na sua faceta mais externa,
como se eu nele não existisse.
Um dia, saberei quem fui.
Há um perigo, contudo. Esse é o de
viver excessivamente imerso na dimensão poético-literária; e a
vida não é isso. Antes pelo contrário, é, em rigor, tudo o que
está fora dela.
Melhor a metáfora do espelho ou a de
um eco ou, ainda, de fantasmagoria activa pois talvez convenha ao
labor estético reduzir o estrépito das coisas a um murmúrio.
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Entrada do Diário Laboratório de 18/2/2018
18/2/2018
Ficção narrativa como função-de-verdade (verdade-do-tempo, bem entendido; está implícito).
Mas, o que é que isso implica?
Um método exploratório cuja pesquisa é descobrimento. Não, o autor não é livre.
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